29/02/2016

Eu sou uma sobrevivente da violência doméstica


  Quem acompanha meu Blog, e lê minhas opiniões formadas, nem imagina que esta mulher forte um dia já viveu o inferno vivido por milhares de mulheres que sofrem violência doméstica, por esse motivo vou contar de forma resumida a minha história.

  Minha história começa quando eu fui morar com meu namorado aos 21 anos, isso porque eu queria enfrentar a minha mãe, porém essa rebeldia me custou caro. Minha intenção era ficar somente por um tempo no apartamento dele e depois morar sozinha, porém ele criou uma espécie de obsessão por mim, e devido ao uso de drogas a coisa só piorava. Minha mãe voltou para Belém-PA e eu fiquei praticamente sozinha em Campinas-SP e como meu pai já era falecido, só me sobravam os irmãos, mas eu não podia contar com eles, pois meu agora dono ameaça matar minha família caso eu contasse o que ocorria em nossa casa eu se eu largasse dele.
  Minha vida eram surras, traições, humilhações e até estupros, hoje eu sei que quando uma mulher não quer ter relações sexuais e é forçada, é considerado estupro, porém aos 21 anos eu acreditava que era obrigada a manter relações por que ele era meu companheiro, este era um momento de tortura grande, por que eu buscava pensar em várias coisas como se minha alma quisesse sair do corpo para não sentir aquele pênis entrando no meu corpo. Quanto às surras, estas ocorriam por nada, ele simplesmente achava que eu tinha olhado para outro homem e me batia, ou quando eu perguntava onde ele tinha ido eu apanhava, ou simplesmente por que ele com delírios da droga achava que eu deveria apanhar, olho roxo era algo normal pra mim, e as desculpas que eu dava para as pessoas é que eu batia a cara no portão, na cama ou em qualquer lugar, mas é claro que as pessoas sabiam o que estava acontecendo, a família dele sabia o que ocorria, mas entre briga de marido e mulher ninguém mete a colher e eu estava com ele por que gostava de apanhar, como dizem mulher de malandro, mas ninguém nunca veio me perguntar se eu gostava, apenas julgavam.
Após 1 ano eu engravidei, mas devido a um problema do meu corpo perdi o bebe com 6 meses de gravidez, no ano seguinte engravidei novamente e com tratamentos consegui levar a gravidez a diante e tive meu filho que é minha vida. Na gravidez só não apanhei porque na minha casa estava morando uma senhora que me protegia, mas ela voltou pra casa dela e a vida continuou com surras, estupros e humilhações.
Quando meu filho estava com 7 anos eu já estava no limite, pensamentos de suicídio era constante, afinal eu já estava morta em vida, e só não o fiz pq pensava na dor do meu filho ao me ver morta e como eu deixaria ele com o pai? Então me enchi de coragem e disse que iria me separar e levei um baita soco na cara, ai a coisa só piorou, ele confiscou meu dinheiro, grampeou o telefone e me deixava trancada em casa, certo dia a porta estava aberta e então fui até o orelhão próximo para ligar para a tia dele, só que a porta estava aberta de proposito por que ele estava me observando, e na mente doentia ele acreditou que eu estava ligando para um suposto amante e neste dia ele me bateu muito, ele enfiou uma estava no meu rosto e dizia que iria me deformar para nem um outro homem olhar para mim, meu filho gritava e se meteu na frente e me protegeu. Na loucura ele me levou ensanguentada a uma igreja evangélica que tinha próximo de casa, eu fiquei feliz por que com certeza o pastor chamaria a polícia, mas quando chegamos lá o pastor disse que eu estava possuída pelo demônio que deveria voltar pra casa com meu marido e voltar no dia seguinte para o culto dos casais, não acreditei que eu ia voltar para meu cativeiro, chegando em casa ele olhava pra mim e dizia que tinha que matar o demônio, eu fiquei apavorada e tentei manter a calma e dizer que no outro dia o pastor ia retirar os demônios, essa tortura começou na parte da manhã e já era tarde da noite quando consegui acalmá-lo e fomos dormir, meu filho coitado estava com muito medo do pai dele me matar. Quando amanheceu eu peguei os documentos do meu filho e os meus e coloquei na mochila de escola dele e descemos por que ele tinha que pegar a perua escolar e naquele dia o meu dono havia deixado dinheiro para pagar a perua , ao chegarmos na rua eu disse ao meu filho que iria fugir, que não aguentava mais, e dei a opção para meu filho, se ele queria ficar com o papai ou viria com a mamãe e ele sem titubear escolheu ficar comigo, lembro que eu expliquei pra ele que a mamãe não tinha dinheiro e não sabia pra onde ir, foi então que eu ouvi a coisa mais linda da minha vida, ele me respondeu que não importava que ele confiava em mim e sabia que eu era capaz de cria-lo, neste momento eu recebi uma injeção de coragem de força tão grande que o peguei pela mão e começai a correr, mas eu estava tão desnorteada e envolvida pelo medo que eu no lugar de me afastar do prédio eu estava voltando, então meu filho mais uma vez me salvou e me conduziu para um local longe e em meio a chuva que caia naquela manhã fomos parar num curtume que eu não sei onde fica, lá pedimos socorro pro guarda que chamou a policia. Os policiais nos levaram para o distrito que eu também não me lembro,  chegando lá mais uma decepção, os policiais me trataram com desprezo como se eu fosse a culpada por ter apanhado, como se ele fosse a vitima, não aguentei ficar lá então não fiz B.O. e sai daquele local, pegamos um táxi e nos dirigimos à delegacia da mulher onde finalmente encontrei amparo, elas entenderam minha situação, me apoiaram e eu senti confiança em fazer o B.O., naquele mesmo dia nos encaminharam na casa abrigo feminina onde eu e meu filho ficamos por um mês, nesse tempo em que ficamos na casa abrigo meu filho não chegava no portão, eu saia acompanhada das policiais algumas vezes, a primeira foi para a delegacia encontra-lo, lá ele e o irmão advogado dele que o acompanhava tiveram  a cara de pau de mentir que eu era louca e blá blá blá, mas felizmente as mulheres da delegacia não acreditaram e marcaram uma audiência com o juiz para regularizar a separação e a situação da guarda do meu filho, como eu sai de casa com a roupa do corpo, eu e meu filho estávamos usando roupas doadas, tive que buscar nossas coisas no apartamento, neste dia fui acompanhada com as policiais que não me deixaram nem um segundo sozinha com ele, embora ele tenha tentado ficar só comigo. Enquanto eu fiquei na casa abrigo minhas forças foram crescendo, era como se eu estivesse me transformando em outra pessoa, aquela menina assustada estava morrendo e em seu lugar estava brotando uma mulher destemida, e foi esta mulher que apareceu na audiência junto ao Juiz. As policiais queria que eu fosse com meu filho para Belém, mas eu não queria mais fugir, não tinha mais medo dele, então eu pedi pra minha mãe ficar com meu filho caso algo acontecesse comigo e no dia da audiência perante ai Juiz eu abri mão de todos os bens, naquela época tínhamos uma agencia de modelos que estava dando um lucro, mas eu não queria nada daquilo eu só queria ser livre e ter meu filho ao meu lado, o resto eu conseguiria. Bem foi decidido a pensão que ele deveria pagar ao meu filho e a guarda ficaria comigo, eu assinei um documento abrindo mão dos bens materiais e como eu decidi ficar em Campinas a casa abrigo já não tinha mais como me proteger , eu teria que sair de lá, porém antes de sair do fórum fui ao banheiro e por algum tempo fiquei só e foi neste momento que ele se aproveitou e se aproximou de mim, ele me segurou pelo braço e me disse que me mataria e eu olhei dentro de seus olhos e respondi que então ele me matasse naquele momento porque se deixasse para depois quem o mataria seria eu caso ele se aproximasse de mim novamente, eu já não era mais a menina assustada, eu não tinha medo dele, eu não tinha medo de morrer, eu não tinha mais medo de viver, e neste momento ele soltou meu braço com um ar de susto como se não estivesse me reconhecendo. Saímos eu e meu filho da casa abrigo e fomos pra casa de uma tia minha e logo depois aluguei uma casa, arrumei emprego e a vida seguiu, ele ate tentou se aproximar mas minha postura forte e firme não permitia que ele me machucasse mais, então ele mudou a tática e veio com ar romântico e carinhoso só que esse método não me enganava e como ele não estava pagando pensão, foi expedido um pedido de prisão e ele veio na minha casa desesperado e eu assinei um recibo como se ele tivesse pago e disse que estava assinando a minha liberdade e ele prometeu não me atormentar mais e realmente o fez, ia visitar nosso filho, por que isso eu nunca neguei afinal ele foi um péssimo marido mas sempre foi um bom pai ao nosso filho. Mas algo me incomodava muito, aquela imagem de ex do fulano, aqueles locais tão cheios de lembranças eu não queria mais, então já estava namorando com outra pessoa na época  e fui conhecer a família dele em Joinville/SC e percebi que lá seria um ótimo local para realmente recomeçar a nossa vida, em um local onde ninguém nos conhecia e não sabia da nossa historia, e então larguei o emprego vendi  os poucos móveis que consegui comprar e nos mudamos pra Joinville, eu e meu filho finalmente pudemos recomeçar a nossa vida. O pai dele sempre que podia ia visita-lo e a vida fluiu. Hoje ele me respeita absurdamente e já pediu varias vezes perdão por tudo que fez pra mim. Meu filho terminou a faculdade, esta trabalhando, tem uma filha linda e uma esposa amorosa. Quanto à mim, estou em um novo relacionamento à 9 anos, voltei para São Paulo , estamos morando juntos a 2 meses. Eu e meu filho superamos tudo unidos,  aprendi a retirar o melhor de toda a situação, e desta minha historia terrível eu reconheço que eu cresci, hoje sou uma mulher diferente, decidida que pode não saber o que quer muitas vezes mas que tem certeza das coisas que não quer jamais, hoje eu me amo, me respeito e não permito que ninguém neste mundo me ofenda e falte com respeito por mim, aprendi que a vida é maravilhosa e eu quero viver muito e cada dia mais feliz.

Peço desculpas se o texto esta um pouco confuso, mas conforme fui escrevendo as lembranças me dominavam e a emoção era difícil de controlar. Hoje eu busco ajudar outras mulheres que estão sofrendo, que não acreditam que a felicidade existe,  procuro  mostrar à essas mulheres, que um dia fui eu, que sim elas podem conseguir ser livres, quero muito levar esperança à essas mulheres  por que eu sei  que é não ter esperança e não ver luz no fim do túnel.